Ao longo dos anos pós-11 de setembro, os principais países visados pelos extremistas na Europa modernizaram suas leis antiterrorismo, baseadas no monitoramento intensivo das pessoas. Câmeras públicas de segurança estão por todos os lados em metrópoles como Londres e Paris. Sob a permissão legal, os serviços policiais acompanham de perto os participantes de fóruns de discussão ou visitantes de sites considerados suspeitos. Por exemplo, é possível que a reportagem Terra tenha atraído a atenção dos serviços antiterrorismo franceses ao fazer pesquisas sobre o assunto para esta reportagem.
Uma vez identificada a atividade suspeita, as pessoas envolvidas têm a vida vasculhada: emails, ligações, mensagens e deslocamentos na cidade ou país são alvo de monitoramento policial constante. Um investigador francês ou britânico tem o direito de parar um trem para prender um suspeito ou pode obrigar as companhias telefônicas, bancárias e de transporte a darem detalhes sobre as atividades e movimentações de alguém que está sendo monitorado por planejamento terrorista. Além disso, a própria população é convidada a contribuir, denunciando pessoas com comportamentos estranhos, sem falar da instalação de uma nova geração de aparelhos de raio-x nos aeroportos, capazes de revelar os detalhes do corpo dos passageiros.
As autoridades atribuem a estes métodos o fato de que novos ataques de grandes proporções não terem voltado a ocorrer, e a cada ano prendem cerca de 200 pessoas sob suspeição de organizarem atentados em solo europeu. Mas, se a segurança aumentou, os abusos também aborrecem os serviços de proteção à vida privada da população.
A Anistia Internacional já advertiu o Reino Unido repetidas vezes sobre os exageros cometidos em nome da luta contra o terrorismo, do qual o maio símbolo foi a morte do brasileiro Jean Charles de Menezes, ocorrida em 2005. Para a organização internacional, a liberdade de a polícia fazer o que bem entende em nome da proteção contra os extremistas - inclusive o poder de despir um suspeito em público, se julgar necessário - fere os direitos dos cidadãos comuns. Na Grã-Bretanha, qualquer pessoa pode ser presa sem receber explicações. Também a Espanha já foi alvo de repreensão da AI, por exagerar nos métodos interrogatórios de presos preventivamente.
"As medidas aplicadas nos termos da lei relativa à prevenção do terrorismo no Reino Unido criaram uma justiça paralela, desigual e secreta para as pessoas suspeitas de atividades ligadas ao terrorismo", declarou a diretora do programa Europa da Anistia Internacional, Nicola Duckworth, no último 10 de agosto, quando pediu mais uma vez que o país alivie as leis de prevenção ao terrorismo.
UE sem lei comum
Na contramão, países como Alemanha, Itália e Holanda são reticentes em adotar medidas semelhantes e não ratificaram, por exemplo, a Convenção Europeia de Prevenção ao Terrorismo, formulada em 2006 no Conselho Europeu. O texto prevê regras bastante vagas sobre até onde as autoridades podem invadir a vida privada da população em nome da proteção contra o terrorismo. Também determina que as informações telefônicas e na internet trocadas pelas pessoas sejam preservadas por no mínimo seis meses e por até dois anos, o que fere as leis nacionais alemãs.
Sem consenso, a União Europeia não possui uma política comum de prevenção a ataques, embora trabalhe de forma integrada no combate ao problema, com o compartilhamento de arquivos e informações sobre grupos e pessoas suspeitas. Porém, os ataques cometidos por um extremista de direita na Noruega, em julho, reascenderam a polêmica e estes países menos rigorosos, como os nórdicos, estudam modificações legislativas para elevar a segurança.
Já França e Bélgica alargaram as formas de monitoramento de ações terroristas ao adotarem leis proibindo o uso da burca, o véu integral islâmico, e do niqab, o que deixa apenas os olhos à mostra. Por trás de argumentos de respeito à laicidade - que interdita símbolos externos de religiosidade - e de defesa dos direitos das mulheres, encontra-se também a preocupação com ataques.
"Hoje a ameaça terrorista é menor, mas está sempre presente. No entanto, a abordagem de uma 'guerra contra o terrorismo' se mostrou ineficaz e muito impopular, especialmente por causar uma estigmatização das populações muçulmanas. Seria mais correto simplesmente se falar de luta contra o crime", avalia o doutor em Direito e em Ciências Políticas francês Jean-François Daguzan, do think tank Fundação pela Pesquisa Estratégica e da Universidade Panthéon-Assas, além de consultor do Ministério da Defesa da França para as questões de terrorismo e relações estratégicas com os países mediterrâneos e do Oriente Médio.
O especialista, autor de 10 obras sobre o assunto, identifica algumas pistas que, na opinião de Daguzan, deveriam ser os focos das autoridades europeias daqui para a frente. "Na prevenção do terrorismo, acho que o trabalho de 'desradicalização' deveria ser intensificado ao invés da pura repressão. Também os esforços de cooperação transatlântica, principalmente com os países em desenvolvimento, pode acrescentar muito à segurança de todos."
Fonte - Terra