Autor: Pastor Paulo Cordeiro
Faz hoje precisamente 10 anos que a moeda única europeia entrava em circulação – a 1 de janeiro de 2002 – em 12 dos 15 países que, na época, formavam o espaço económico e político da UE (União Europeia). Se bem que, oficialmente, esse início já tivesse ocorrido três anos antes – a 1 de janeiro de 1999 – em 11 dos 12 países (com exceção da Grécia, que só entrou na Euro Zona em 2001), só dez anos atrás os europeus desses 12 países puderam ver e tocar nas notas e moedas que então passaram literalmente a circular nesses países da chamada Euro Zona.
Atualmente existem 17 países (dos 27 países que compõem a UE) que têm o euro (€ ou EUR) como sua moeda “nacional”. Alguns países pequenos que não praticam políticas de moeda própria usam também o euro: Andorra, Mónaco, São Marino e até o Vaticano. Montenegro também utiliza o euro como sua moeda oficial. Também no Kosovo, o euro passou a circular mesmo antes da sua declaração de independência.
Há quase 20 anos, mais precisamente a 7 de fevereiro de 1992, na cidade holandesa de Maastricht, era assinado o Tratado que ficou conhecido pelo nome dessa cidade, mas também como o Tratado da União Europeia. Iria entrar em vigor a 1 de novembro de 1993 e, entre outras coisas, iria mudar o nome de Comunidade Económica Europeia (C.E.E.) em União Europeia (U.E.), Mas, de longe, aquilo que mais chamou a atenção desse Tratado, foi o facto de ter criado um calendário bem preciso para a entrada em funcionamento de uma moeda única europeia antes do final da década, do século e do milénio.
Quase vinte anos depois de ter sido “concebido” e dez anos depois de ter sido “dado à luz”, eis que o euro passa hoje por uma difícil crise que, muitos esperam, possa ser sintomática do seu breve “falecimento”. Será que em breve assistiremos à “morte” e ao “funeral” do euro?
Não é meu propósito, neste artigo, entrar em detalhes de caráter técnico, que têm a ver com as condições económicas e financeiras da atualidade. Deixo essa análise para os respetivos peritos dessa área. O meu objetivo é poder olhar para o euro, sob uma perspetiva bíblico-profética, caso tal leitura seja possível. E eu creio que ela é possível!
20 anos atrás, lembro-me de ter ouvido algumas vozes vaticinarem que o projeto de uma moeda única na Europa nunca se iria concretizar, alegando que a profecia de Daniel 2 “não permitiria” tal cenário! Os que se mostravam céticos relativamente à entrada em circulação de uma moeda única europeia e ao aprofundamento político da Europa, tiravam as suas convicções da leitura da profecia de Daniel 2, e particularmente do versículo 43: “Quanto ao que viste do ferro misturado com barro de lodo, misturar-se-ão mediante casamento, mas não se ligarão um ao outro, assim como o ferro não se mistura com o barro.” (negrito acrescentado).
Hoje alguns afirmam que o euro foi apenas um “acidente de percurso” e que, muito em breve, se assistirá ao desmoronar do euro, assim como do projeto político-económico da UE. Deixem-me dizer-vos claramente, e já à partida, que nunca partilhei e continuo a não partilhar dessa interpretação “profética”. Mencionarei, de seguida, as razões pelas quais não partilho desse ponto de vista.
A Profecia de Daniel 2
Antes de mais nada, permitam-me colocar as seguintes questões para vossa consideração e reflexão: estará esta profecia milenar a falhar, neste período crucial da História, precisamente antes da segunda vinda de Cristo, depois de se ter mostrado verdadeira durante séculos? Será que teremos de rever a nossa interpretação tradicional da profecia de Daniel 2? Ou será apenas que alguns, no passado, não conseguiram simplesmente explorar toda a riqueza da profecia de Daniel 2 à luz de outras profecias bíblicas?
Deixem-me relembrar-vos aquilo que certamente todos vós já sabeis a respeito da profecia de Daniel 2: trata-se de uma profecia que cobre um período enorme de tempo, nada mais, nada menos, do que um período aproximado (por excesso) de 2500 anos. Por esta mesma razão, facilmente se compreende que a profecia não entra em detalhes minuciosos sobre qualquer período específico de tempo que faça parte integrante do período global de tempo a que ela se refere.
Com isto pretendo apenas dizer que a profecia de Daniel 2 é como uma lente “grande angular”, que permite ter uma visão sintética da História nas suas grandes linhas, que são perfeitamente suficientes para se visualizar um “fio condutor” da História extremamente compreensível.
Contudo, Daniel 2 não esgota todos os detalhes proféticos! Se assim não fosse, não seriam necessárias outras profecias (nomeadamente as profecias dos capítulos 7, 8, 9 e 11 do próprio livro de Daniel), que nada mais fazem do que ampliar a “matriz básica” fornecida por Daniel 2! A cena do julgamento no céu, em Daniel 7:9-14 (com a correspondente explicação nos versículos 22, 26 e 27), a purificação do santuário, em Daniel 8:13-14 e 26, em conexão íntima com o julgamento no céu, a profecia das 70 semanas em Daniel 9:24-27 e a especificidade do conflito norte-sul em Daniel 11:5-45, são dados proféticos preciosíssimos que simplesmente não aparecem mencionados em Daniel 2!
Contudo, não é menos verdade que estes dados proféticos que acabei de referir não seriam seguramente tão bem compreendidos, pelo menos sob o ponto de vista cronológico, se não fosse a tal “matriz básica” que nos é fornecida por Daniel 2!
Resumindo: Daniel 2 é uma profecia extremamente importante, visto nos dar uma imagem do quadro geral de acontecimentos. Contudo, por ser tão sintética não poderia ser, obviamente, muito analítica! Daniel 2 dá-nos uma visão global do tempo – desde os dias de Daniel (“depois disto” – Daniel 2:29) até aos “últimos dias” (Daniel 2:28) – mas não nos dá uma compreensão pormenorizada de nenhum tempo específico, nomeadamente do tempo do fim. Para ficarmos com uma noção mais precisa dos acontecimentos do tempo do fim, a profecia de Daniel 2 é pura e simplesmente insuficiente(1)!
Este tem sido, a meu ver, o erro que, talvez de forma ingénua, se tem comummente cometido! E este erro seria simplesmente irrelevante se não fosse responsável por lançar dúvidas sérias na mente de muitos estudantes da profecia bíblica, por verem a incoerência entre o que “está profetizado” e a realidade que está diante dos nossos olhos!
Uma união global nos últimos dias
Tal como acima referi, assim como os outros capítulos proféticos do livro de Daniel lançam luz adicional sobre a profecia específica de Daniel 2, assim o livro de Apocalipse (livro do mesmo género literário do livro de Daniel) lança luz adicional não só sobre a profecia específica de Daniel 2 mas igualmente, e em particular, sobre os acontecimentos do tempo do fim.
Ora, é justamente no livro de Apocalipse que encontramos uma outra profecia específica que alarga consideravelmente, e de forma correta, a nossa compreensão de Daniel 2 e dos acontecimentos do tempo do fim. Trata-se da profecia que está contida em Apocalipse 16:13-14. Passo a transcrever o seu conteúdo: “Então, vi sair da boca do dragão, da boca da besta e da boca do falso profeta três espíritos imundos semelhantes a rãs; porque eles são espíritos de demónios, operadores de sinais, e se dirigem aos reis do mundo inteiro com o fim de ajuntá-los para a peleja do grande Dia do Deus Todo-poderoso” (negrito e sublinhado acrescentados).
Leram bem? O que é que “espíritos de demónios” farão nos últimos dias (esta passagem aparece no contexto do derramamento das 7 últimas pragas!)? Dirigir-se-ão “aos reis do mundo inteiro” (isto é, aos líderes máximos de todas as nações)! Com que objetivo? “Com o fim de ajuntá-los”!
Este “mundo inteiro” aqui referido, certamente que inclui a Europa, ou não acham que assim seja? Se há continente que não deixará seguramente de estar “na mira” dos demónios, esse continente é seguramente a velha Europa “cristã”, onde está sediado o grande poder – o Vaticano – que dominará o mundo nos últimos dias!
Então, segundo esta profecia do livro de Apocalipse, haverá ou não uma tendência crescentepara a unificação das nações entre si? Importa igualmente referir que a ação desses “espíritos de demónios” mencionados, que conduz os “reis do mundo inteiro” a uma união global, não acontecerá de um dia para o outro, mas será um processo gradual que atingirá o seu clímax no tempo de “Armagedom”(2).
Como reconciliar as duas profecias?
A profecia de Apocalipse 16:13-14, se bem que lance imensa luz sobre os acontecimentos do tempo do fim, não invalida, contudo, nenhum aspeto da profecia de Daniel 2!
Parece contraditório o que acabo de referir? Não, não é!
Daniel 2 afirma, e devemos acreditar nisso, que “certo é o sonho, e fiel, a sua interpretação” (v. 45). Portanto, se os “reinos” que existirão imediatamente antes que “o Deus do céu [suscite] um reino que não será jamais destruído” (v. 44) “não se ligarão um ao outro” (v. 43), então podemos ter a certeza que assim será!
Por outras palavras, esses “reinos” não estarão na verdade ligados na sua essência, ou seja, não haverá uma unidade real e genuína a uni-los, MAS estarão estrategicamente ligados entre si, movidos (talvez alguns deles inconscientemente) pelos tais “espíritos de demónios” que os ajuntarão(3) com o único objetivo de eles poderem apresentar uma frente unida contra o povo de Deus!
A crise final pela qual Jesus passou oferece-nos um exemplo perfeito do que acontecerá ao povo de Deus durante a crise final da História deste mundo! Também Jesus enfrentou, Ele próprio, a coligação de forças que nunca estariam coligadas entre si, não fosse a necessidade de Satanás apresentar uma frente unida contra Jesus: “Mas Herodes, juntamente com os da sua guarda, tratou-O com desprezo, e, escarnecendo d’Ele, fê-lo vestir de um manto aparatoso, e o devolveu a Pilatos. Naquele mesmo dia, Herodes e Pilatos se reconciliaram, pois, antes, viviam inimizados um com o outro.” (Lucas 23:11-12). Também fariseus e saduceus se coligaram contra Jesus (ver Mateus 16:1), mas isso não significava que se encontravam realmente ligados entre si pois, anos mais tarde, já os encontramos de novo em conflito uns contra os outros (ver Atos 23:6-8).
Conclusão
Penso que agora já devem ter visualizado o quadro completo! Teremos, no tempo do fim, uma Europa coligada, mas não verdadeiramente unida entre si! E esta é a realidade que todos nós podemos observar atualmente!
Reparem que a profecia de Apocalipse 16:13-14 não afirma que os “espíritos de demónios” “se dirigem” aos povos do mundo inteiro, mas antes aos seus líderes, “aos reis do mundo inteiro”, porque conseguindo um consentimento entre os líderes, os liderados acabam por seguir, mesmo por vezes contrariados, “a reboque” daqueles!
A construção da União Europeia está sendo feita, desde o início, não a partir das bases, dos povos, mas sim a partir das cúpulas institucionais político-administrativas(4)! Isto dá-nos a certeza de quem é que está verdadeiramente a trabalhar nos bastidores! Por detrás dos múltiplos acordos que se têm conseguido, e que fazem os políticos europeus parecerem grandes promotores da unidade europeia e da paz, estão – eu sei que não é politicamente correto afirmar isto, mas é a verdade! – “espíritos de demónios” trabalhando afincadamente para unir estrategicamente todo o mundo, a fim de não deixar, humanamente falando, num futuro próximo, nenhuma possibilidade de escape para aqueles que pretenderem permanecer leais aos “mandamentos de Deus e à fé de Jesus” (Apocalipse 14:12).
(1) A profecia de Daniel 2 pode ser corretamente comparada a um mapa-múndi, ou planisfério, que nos permite ter uma visão global do planeta. Contudo, se bem que tal visão nos permita ficar a conhecer, com rigor, a disposição dos países entre si (no caso de um mapa-múndi político), não nos permite conhecer detalhes muito significativos de cada país. Se quisermos viajar num determinado país, não é seguramente com um mapa-múndi que estaremos bem servidos, mas sim com o correspondente mapa desse país específico!
(2) O Armagedom (ver Apocalipse 16:16), ao contrário do que afirmam a esmagadora maioria dos cristãos evangélicos de hoje (que subscrevem a chamada visão dispensacionalista da História) e afirmaram alguns pensadores adventistas, no passado, não é uma guerra literal que irá ocorrer algures num local do Médio Oriente. Trata-se, isso sim, da última manifestação do Grande Conflito, em que todos os poderes da Terra coligados entre si intentarão lançar um derradeiro e decisivo ataque contra o Povo de Deus!
(3) Talvez se pudesse fazer um estudo etimológico aprofundado destas duas palavras usadas em Daniel 2:43 e Apocalipse 16:14, mas creio que facilmente se intui que “ligar” e “ajuntar” pode não significar necessariamente a mesma coisa! Duas coisas podem estar “juntas” (como o caso do ferro e da argila nos pés da estátua de Daniel 2) sem contudo estarem “ligadas” entre si. Outro exemplo, que é, aliás, referido no próprio texto bíblico de Daniel 2:43: duas pessoas podem estar “juntas” em casamento sem contudo se encontrarem verdadeiramente “ligadas” entre si! Da mesma maneira os “reinos” deste mundo no tempo do fim estarão “congregados” ou “juntos”, mas não necessariamente “ligados”!
(4) Quantas vozes críticas não se têm levantado, dentro dos países que compõem a UE, contra essa mesma UE? Ainda recentemente, quando o primeiro-ministro britânico “vetou” uma decisão vital tomada por outros países da UE, ele foi veementemente criticado por todos os líderes europeus, e até – imaginem! – pelo seu próprio vice-primeiro ministro, pertencente a um partido de coligação do atual Governo britânico. Contudo, segundo sondagens feitas junto da opinião pública britânica, mais de 60% dos britânicos estavam de acordo com a posição assumida pelo seu primeiro-ministro. Não mostra isto claramente que os povos em si estão separados do projeto europeu, mas que este é apoiado pela esmagadora maioria dos seus líderes políticos?
Fonte - O Tempo Final