Estamos testemunhando os frutos de um realinhamento histórico no cristianismo
No início deste ano, ocorreu no Vaticano um evento extraordinário. O bispo Tony Palmer, de uma igreja anglicana separatista, se encontrou com o papa Francisco. Eles tinham se tornado amigos quando Bergoglio ainda era arcebispo de Buenos Aires e Palmer era missionário evangélico carismático anglicano na Argentina.
Depois de eleito, Francisco telefonou para Palmer e propôs que eles se encontrassem. O papa perguntou a Tony Palmer o que ele poderia fazer para incentivar a unidade com os protestantes evangélicos. O bispo Tony pegou seu iPhone e disse a Francisco: “Por que não gravamos um vídeo de saudação para o grupo de cristãos carismáticos influentes que eu vou encontrar numa conferência no Texas na semana que vem?”.
O papa Francisco aceitou.
Depois que o vídeo com a saudação do papa foi mostrado na conferência de líderes protestantes evangélicos, o televangelista Kenneth Copeland afirmou que queria visitar o papa.
A visita já aconteceu. Rick Wiles relata que uma delegação chefiada pelo bispo Tony Palmer viajou a Roma e se encontrou com o papa Francisco, numa conversa que durou três horas. James e Betty Robison, apresentadores do programa de televisão Life Today [Vida Hoje], e Kenneth Copeland, fundador dos Ministérios Kenneth Copeland, estavam acompanhados pelo reverendo Geoff Tunnicliff, presidente da Aliança Evangélica Mundial, pelos reverendos Brian Stiller e Thomas Schirrmacher, também da Aliança Evangélica Mundial, e pelo reverendo John Arnott e sua esposa, Carol, co-fundadores dos ministérios Partners for Harvest [Parceiros na Messe], de Toronto, no Canadá.
Esse encontro é ainda mais impactante quando se sabe que, não muito tempo atrás, os evangélicos conservadores da América do Norte viam a Igreja católica como a "grande prostituta da Babilônia" e o papa como o anticristo.
Os líderes evangélicos não só ficaram impressionados com a simplicidade e com o calor receptivo do papa Francisco, como claramente manifestaram uma comunhão em Cristo que não havia no passado.
Como podemos entender esse entrosamento dos conservadores evangélicos com o papa Francisco?
O que estamos testemunhando é fruto de um realinhamento histórico no cristianismo.
Já faz algum tempo que a verdadeira divisão dentro do cristianismo não é entre católicos e protestantes. É entre os cristãos que acreditam numa religião revelada e os que acreditam numa religião relativa. A verdadeira divisão é entre os progressistas que desejam alterar a fé histórica de acordo com o espírito de cada época e aqueles que acreditam que o espírito de cada época é que deve ser desafiado pela verdade eterna e imutável do Evangelho cristão.
Aqueles que acreditam numa forma relativa, progressista e modernista do cristianismo descartam o elemento miraculoso da religião, acreditam que a Igreja e as Escrituras são apenas acidentes históricos criados pelo homem e acham que a Igreja deve se adaptar completamente às necessidades da sociedade moderna. Os progressistas veem a Igreja como um agente de mudança social e pensam que a principal tarefa dos cristãos é ser ativistas políticos.
Do lado oposto, estão aqueles que acreditam que o Evangelho de Jesus Cristo é revelado por Deus para a salvação das almas e para a transformação do mundo. Estes cristãos históricos acreditam que as Escrituras são inspiradas por Deus e que o Evangelho não pode ser alterado pela cultura de época alguma. Eles podem ser chamados de “cristãos clássicos”, porque acreditam na “antiga história” de uma humanidade pecadora e de um Deus misericordioso que entregou o próprio Filho pela salvação do mundo.
Cristãos progressistas e clássicos existem em todas as confissões e em todas as estruturas eclesiais. Há católicos clássicos e progressistas e há protestantes clássicos e progressistas. O recente encontro entre o papa Francisco e esses líderes evangélicos revela que os cristãos clássicos de uma confissão têm mais em comum com os cristãos clássicos de outra confissão do que com os progressistas da própria confissão.
O surpreendente do papado é que as palavras e os atos dos papas não apenas são firmemente enraizados no passado, mas, muitas vezes, são proféticos, voltados para o futuro. É o caso das palavras e atos de São João Paulo II e de Bento XVI, por exemplo.
E acontece o mesmo com o papa Francisco. Seu encontro com os líderes evangélicos indica um novo alinhamento dentro do cristianismo global. Enquanto os cristãos progressistas se fundem cada vez mais com o “espírito do tempo”, a divisão entre eles e os cristãos clássicos se mostra cada vez mais aguda. Em paralelo, os cristãos de todas as confissões clássicas começam a se unir e a cooperar entre si. Os cristãos clássicos da ortodoxia oriental, do catolicismo romano, do anglicanismo clássico e do protestantismo evangélico vão encontrar cada vez mais formas de entendimento.
A comunhão cada vez mais estreita com os evangélicos se verá acelerada quando o cristianismo progressista tiver se afastado a ponto de se transformar em algo diferente do próprio cristianismo. A aproximação entre evangélicos clássicos e católicos também brotará, em contraste com as forças escuras que se levantarão em várias frentes contra Cristo e sua Igreja. A oposição ao cristianismo clássico e a latente ameaça de perseguição darão um novo e mais profundo significado ao termo "evangélico católico".