Influência crescente
Quando os delegados se reunirem em dezembro em Paris para negociar um acordo internacional de combate a mudanças climáticas, Ban Ki-Moon, secretário-geral das Nações Unidas, espera contar com um poderoso aliado: o papa. Ban Ki-Moon estava entre políticos, cientistas e líderes de várias religiões que se reuniram em 28 de abril em uma casa do século 16, no Vaticano, para discutir os aspectos morais do aquecimento global e desenvolvimento sustentável. O encontro inédito ocorreu enquanto o papa Francisco prepara uma carta encíclica aos bispos sobre as alterações climáticas, a ser lançada neste verão boreal. A encíclica “terá um profundo impacto sobre as negociações relacionadas a mudanças climáticas”, declarou Ban Ki-Moon a jornalistas após breve audiência com o papa, destacando que o papa Francisco abordará também a Assembleia Geral da ONU, em 25 de setembro. As mudanças climáticas já estão ocorrendo, alertou Ban Ki-Moon, e o mundo está correndo contra o tempo para afastar impactos graves e irreversíveis do aquecimento - opinião compartilhada pelos cientistas que participaram do encontro.
Muitos pesquisadores na reunião ansiavam considerar as mudanças climáticas sob uma perspectiva diferente: a de líderes religiosos que falam sobre o aquecimento global e seus efeitos com autoridade moral. Esses líderes podem atingir um público enorme, avalia Partha Dasgupta, economista da Universidade de Cambridge, Reino Unido, e um dos organizadores da reunião. “Como acadêmicos, podemos ter alunos de pós-graduação, mas não temos um rebanho”, pondera ele. “Os líderes religiosos têm um rebanho.”
Os participantes da reunião foram convidados a assinar uma declaração elaborada por um pequeno grupo de cientistas e pelo bispo Marcelo Sánchez Sorondo, chanceler da Pontifícia Academia das Ciências, assessor do papa Francisco sobre assuntos científicos e co-patrocinador da reunião. A declaração diz que a mudança climática induzida pelo homem é “uma realidade científica”, e que a humanidade tem “o imperativo moral e religioso” de mitigá-la. Ele também argumenta que os políticos têm uma responsabilidade especial para garantir o sucesso das negociações de Paris sobre o clima e proteger os pobres e vulneráveis.
“Proteger a humanidade é proteger a criação, e para proteger a criação deve-se proteger a humanidade”, disse Metropolitan Emmanuel, bispo da igreja ortodoxa grega francesa, na reunião. Din Syamsuddin, líder espiritual muçulmano da Indonésia, afirma considerar necessário que sua religião se desloque de uma perspectiva teológica conservadora sobre o meio ambiente para uma posição mais progressiva. Segundo ele, a primeira vê a natureza como um objeto, [visão] que pode levar à sua espoliação.
O encontro também suscitou controvérsia. O Instituto Heartland, think tank liberal em Chicago, Illinois, organizou uma reunião rival em hotel fora dos muros do Vaticano. O grupo quer dissuadir Francisco “de emprestar a sua autoridade moral para a agenda politizada e não científica das Nações Unidas sobre o clima”, de acordo com o material de divulgação do encontro.
(Scientific American Brasil, via Nature, 30 de abril de 2015)
Nota Michelson Borges: Para reforçar a campanha em favor do meio ambiente, ganha repercussão o argumento de que combater o aquecimento global é, também, uma questão moral e religiosa. Alguém ainda duvida de que a bandeira ecológica tem enorme poder de “cola” capaz de unir religiosos, políticos e cientistas – um verdadeiro ECOmenismo? Assista ao vídeo abaixo para entender as possíveis implicações proféticas desse cenário.