A versão mais pessimista entre os quatro cenários considerados possíveis para o aquecimento global com mudanças climáticas, preparados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPPC), órgão das Nações Unidas (ONU), prevê que a temperatura média da Terra pode elevar-se em quase 5º C (4,8º C) até 2100. É uma situação catastrófica e inédita na história da civilização, ainda que a maior parte das pessoas possa não se dar conta disso levando em conta a variação térmica de um único dia, que pode iniciar-se, digamos, com 16º C e atingir 36º C ou mais, antes de voltar a cair. A diferença, aqui, está na expressão “temperatura média”, o que significa dizer que as temperaturas diárias globais serão significativamente elevadas e nos levam, a cada dia, para uma situação de completa insustentabilidade em escala planetária.
De um ponto de vista local, o pior cenário sugere que poderá haver tanto aquecimento insuportável quanto frio intenso, resultados de alterações no regime de ventos e correntes marinhas e, em muitos casos, custará a vida de pessoas e animais, sem incluir impactos agrícolas, com o comprometimento de safras. [...]
Em julho deste ano, Kerry Emmanuel, do Massachusetts Institute of Technology (referências da edição de novembro da Scientific American Brasil, neste momento em fase de edição), atualizou modelos computacionais utilizados pelo IPCC com dados mais precisos sobre ciclones. Com isso demonstra que, ainda durante a vigência do relatório que começou a ser divulgado, tempestades poderosas, e por isso mesmo destruidoras, devem aumentar não apenas em intensidade, mas também em frequência em todo o mundo.
O que, em síntese, um quadro como este sugere? Que o IPCC deve alterar imediatamente sua forma de produzir e liberar dados, de forma que a opinião pública internacional, melhor e mais rapidamente informada, pressione seus governos a adotar políticas restritivas às emissões de gases de efeito estufa. De imediato, essa é a única alternativa ao alcance das mãos da sociedade humana. E o resultado desse esforço deve convergir para a próxima conferência das partes, que reúne 195 países, marcada para 2015, em Paris, numa tentativa de limitar o aquecimento a 2º C.
A mídia deve sensibilizar para cumprir o papel que lhe é devido, avaliando com um mínimo de lucidez conteúdos relevantes e separando-os do que simplesmente é destituído de importância, num processo amplo de equipar comunidades nacionais para uma tarefa que até recentemente parecia impensável, por semelhar cenário da pura ficção: inibir o descontrole climático da Terra, nossa morada cósmica.
As vozes cínicas de sempre, comprometidas com a memória e não com a inteligência, pautadas pelo ego e não pela ética (e estética), certamente esboçarão sorrisos irônicos típicos de comportamento acovardado. Dirão que não está devidamente demonstrado que o aquecimento global com mudanças climáticas é devido a ações antrópicas (deflagrado por humanos).
Argumentarão, como têm feito nos últimos tempos, que mudanças naturais, entre elas devido à variação da radiação solar, alterações orbitais de longos períodos da Terra e mesmo a travessia de nuvens galácticas mais densas, de gás e poeira, no deslocamento do Sistema Solar em direção à constelação do Hércules (ápex solar), justificam essas alterações.
O clima, de fato, é extremamente dinâmico e temperaturas globais médias mais elevadas foram registradas, por exemplo, durante o longo reinado dos dinossauros, algo entre [supostos] 200 milhões e 65 milhões de anos atrás [e aqui o aquecimentismo e o evolucionismo dão-se as mãos]. Ocorre que essas mudanças foram lentas, com tempo para que as espécies se adaptassem (ainda que a extinção seja igualmente dinâmica), o que não ocorre neste momento.
E, de certa forma, o mais importante. Esse passado remoto não incluiu uma civilização como a atual. Os humanos sabem das ocorrências passadas por marcas deixadas por esses processos naturais em rochas e gelos polares, mas não estavam lá para presenciar essas cenas. Agora, passamos de sete bilhões de pessoas na Terra, o que significa dizer que temos, de um ponto de vista de ciência e ética, um compromisso que não havia no passado remoto.
O relatório do IPCC fala em 95% (contra 90% anteriormente) de certeza de o aquecimento global atual – disparado após a deflagração da Revolução Industrial, que lançou mão da energia contida em combustíveis fósseis em vez de músculos humanos e animais para produzir trabalho e, portanto, riqueza – ser de origem antrópica. Os 5% restantes para completar 100%, na verdade, são uma margem de manobra para evitar críticas metodológicas de um pensamento predominantemente conservador quanto à interpretação da natureza antrópica do aquecimento.
Mas, e se essa pequena margem, os 5%, ainda puderem ser a interpretação correta do fenômeno (aquecimento natural)? As iniciativas preservacionistas, sugeridas pela versão antrópica, seriam, comparativamente falando, negativas em que? Em praticamente nada. Daí a conveniência de serem adotadas o mais breve possível. [Ou seja, causado ou não pelo ser humano, o aquecimento deve ser “freado” a todo custo. Mudança sutil de argumento...]
Individualmente, é mais inteligente nos prepararmos para riscos maiores e, se eles não se revelarem tão desastrosos, tanto melhor. E isso também é válido para o coletivo, neste caso o conjunto da sociedade humana. Assim, estaremos, como se pode dizer coloquialmente, “no lucro” e não no prejuízo, como sugerem recomendações que vão das fábulas de Esopo a uma diversidade de mitologias de todos os povos. [...]
Em relação ao conteúdo divulgado pelo IPCC, agora, e o que deve ocorrer até outubro de 2014, é necessária uma reação nova e inédita da comunidade internacional via governos nacionais – o que não é nada trivial, deve-se reconhecer. [...] Na essência, questões como aquecimento global com mudanças climáticas por liberação de gases de efeito estufa dizem respeito a uma transformação paradigmática nos padrões de energia utilizados por uma civilização como a nossa, que se prepara para espalhar-se por seu sistema solar de origem, supondo que não sejamos os únicos no Universo. [...]
Mudanças climáticas vão ameaçar desde o voo de aviões, com aumento de turbulência, à produtividade agropecuária nos campos, passando pela queda na oferta de alimentos dos mares, acidificados e com a vida comprometida. Além, como parece já ficar evidente, do aumento de desastres naturais. Os preciosos estoques de águas deverão sofrer desvios ou se tornarão ainda mais escassos em determinadas regiões, com perturbação do ciclo hidrológico, a maneira como a água circula na Terra, acumulando-se em nuvens e precipitando como chuva ou neve, para abastecer fontes de lagos e rios que correm para o mar.
Num cenário assim, as previsões do IPCC, embora pareçam pura ficção, na realidade advertem de forma dramática que nossos netos não herdarão a Terra.
(Ulisses Capozzoli, Observatório da Imprensa)
Nota Criacionismo: Em seu texto (releia os trechos grifados), Capozzoli, que é editor da revista Scientific American Brasil, dá o tom alarmista de que os ECOmenistas tanto precisam (clique aqui para ler mais sobre o ECOmenismo). As novas previsões do IPCC, sem dúvida, vão dar novo “gás” à campanha de “salvamento da Terra”, caso contrário, “nossos netos não herdarão a Terra”. Não se trata aqui de ser “negacionista”, como acusam alguns. Não tenho por que, necessariamente, duvidar de que esteja havendo um aquecimento global. Ele até pode ser a mola propulsora dos desastres previstos na Bíblia e que antecederiam a volta de Jesus. Já que os aquecimentistas fizeram algumas concessões (ou seja, mesmo que o aquecimento não seja causado pelo homem, vale a pena implementar medidas para a redução dos gases), faço também a minha: mesmo que o aquecimento global seja em grande medida causado pelo ser humano, o que mais me preocupa é o clima de medo que se quer alimentar e as decisões drásticas que podem ser tomadas num clima assim. O 11 de Setembro serviu de exemplo: em ambientes de terror, as pessoas desistem até de suas liberdades. Não podemos nos esquecer de que uma das medidas para ajudar nesse esforço de “salvar a Terra” foi sugerida pela Igreja Católica e apoiada por governos e até mesmo por ateus: reservar o domingo para ser um dia de baixa emissão de carbono (existe até um projeto para isso apoiado pelo The Guardian). Mesmo que os guardadores do sábado tenham suas motivações ecológicas e se unam aos esforços pela preservação do meio ambiente (na verdade, eles até têm mais motivos para isso, pois se veem como administradores da criação de Deus), a recusa em trabalhar aos sábados (já que o domingo será o dia escolhido para o descanso) poderá ser vista com maus olhos por um mundo que estará lutando pela sobrevivência de todos.