Em uma ofensiva coordenada de relações públicas, a Casa Branca está usando acadêmicos amigáveis e confiáveis – surpreendentemente, eles ainda existem – para espalha a notícia de que o presidente Bush está otimista e confiante como nunca. Pode até ser verdade.
O que eu não entendo é porque nós temos que considerar a contínua confiança de Bush como uma coisa boa.
Lembre-se, Bush estava confiante há seis anos, quando ele prometeu que capturaria Osama, vivo ou morto. Ele tinha confiança há quatro anos, quando ele disse para os insurgentes virem com tudo. Ele tinha confiança há dois anos, quando ele disse para Brownie que ele estava fazendo um trabalho maravilhoso.
Agora o Iraque está um pântano sangrento, o Afeganistão está deteriorando e a própria Estimativa de Inteligência Nacional da administração Bush admite que, graças à liderança pobre de Bush, a América está perdendo a luta com a Al-Qaeda. Mesmo assim, Bush permanece confiante.
Desculpe, mas isso não é acalma: isso é amendrontador. Isso não mostra a força do caráter de Bush, mostra que ele perdeu a noção da realidade.
Na verdade, não está claro se ele já teve noção da realidade. Eu escrevi sobre o “complexo de infalibilidade” da administração Bush, sua falta de capacidade em admitir erros ou encarar problemas reais que não queria lidar, em junho de 2002. Na mesma época, Ron Suskind, uma jornalista investigativa, teve uma conversa com um consultor de Bush que ridicularizou a “comunidade baseada na realidade”, argumentando que “quando agimos, criamos nossa própria realidade”.
As pessoas que se preocupavam que a administração Bush estivesse vivendo em um mundo de fantasias costumavam ser classificadas de “vítimas de transtorno de Bush”, liberais que ficaram loucos pelo sucesso de Bush. Agora, entretanto, é uma síndrome que se espalhou até entre os ex-fiéis à Bush.
E por mais que Bush não tenha mais crentes devotos, ele ainda tem várias pessoas que possibilitam suas idéias – pessoas que entendem a estupidez de suas ações, mas se recusam a fazer qualquer coisa para impedi-lo.
O principal exemplo dessa semana é o senador Richard Lugar, de Indiana, que foi manchete de jornais há umas semanas com um discurso declarando que “nosso rumo no Iraque perdeu contato com nossos interesses vitais de segurança nacional”. Lugar é um homem inteligente e consciente. Ele já agiu com coragem para impedir outro desastre de política externa, convencendo um relutante Ronald Reagan a parar de apoiar Ferdinand Marcos, o corrupto líder das Filipinas, depois de uma eleição roubada.
Porém, não houve coragem política quando os democratas do Senado tentaram conseguir votos em uma medida que forçaria uma mudança de direção no Iraque, e os republicanos reagiram ameaçando um atraso. Lugar, junto com outros republicanos que expressaram dúvidas contra a guerra, votou contra interromper o debate, ajudando a garantir que a estupidez que ele, tão precisamente descreveu em seu discurso, continue no Iraque.
Graças à esse voto, nada irá acontecer até que o general David Petraeus, o comandante chefe no Iraque, entregue seu relatório em setembro. Mas também não espere muito. Eu espero que ele me prove errado, mas a história do general sugere que ele é mais uma pessoa inteligente e consciente que permite Bush a fazer coisas estúpidas.
Eu não sei porque o artigo que Petraeu publicou no The Washington Post no dia 26 de setembro de 2004 não recebeu mais atenção. Afinal de contas, acaba com qualquer sensação de que o general fique acima da política: eu não acho que seja prática padrão para oficiais servindo no Exército publicarem artigos de opinião que visivelmente ajudam um encarregado, seis semanas antes de uma eleição nacional.
No artigo, Petraeus nos disse que os “líderes iraquianos estão progredindo, liderando seu próprio país e suas forças de segurança de maneira corajosa”. E essas forças de segurança estão indo bem: seus líderes “estão mostrando coragem e flexibilidade” e “forças se uniram nos meses recentes”.
Em outras palavras, Petraeus, sem dizer nada falsificável, conduziu uma impressão totalmente ilusória, extremamente conveniente para seus mestres políticos, que a vitória estava na esquina.
E o melhor palpite tem que ser que ele fez a mesma coisa três anos depois.
Você sabe, nessa altura, eu acho que precisamos parar de culpar Bush pela confusão que estamos. Ele é o que ele sempre foi, e todos exceto um grupo central de pessoas leais igualmente iludidas sabem.
E Bush continua a causar danos porque muitas pessoas que entendem como sua estupidez está colocando a segurança da nação em risco ainda se recusam, por cautela política e zelo em excesso pela carreira, a fazer qualquer coisa a respeito.
- Paul Krugman