quarta-feira, 23 de julho de 2008

O "integrismo" e o papado

Ao mesmo tempo em que Le Monde faz significativas reticências, círculos ultracatólicos de Paris se preparam para receber a visita do papa Bento 16 nos dias 12 e 13 de setembro próximo. A Igreja católica de Paris já distribui os folhetos de convite aos fiéis, com indicações sobre como participar dos eventos, organizados como um grande espetáculo público da fé. Papamóvel, telas gigantescas de TV, alameda de luzes, vigílias musicais e outros recursos do show business se anunciam como complementos às missas e orações.
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Desobediência ao Vaticano

Pode-se ver nisso tudo a mesma rotina das viagens do papa João Paulo II, que também demonstrava especial predileção, ou devoção, por efeitos de mídia. Mas as reticências bem acentuadas de um jornal ponderado como Le Monde têm por trás uma preocupação particular, que afeta diretamente a França: as boas graças do atual papa para com os círculos ultraconservadores ou integristas do catolicismo francês.

"Integrismo", para quem deseja clareza imediata, é o atraso falando, em todos os continentes, em nome de Deus. A palavra é hoje praticamente um sinônimo de "fundamentalismo", embora esta seja mais antiga, já que se tornou conhecida em finais do século 19 como uma autodesignação positiva de grupos convencidos de que detinham a verdadeira interpretação dos Evangelhos. O integrista, desde o século 20, vive dessa mesma pretensão de exercer a "integridade" da religião. ...
O perigo fundamentalista

Pois bem, Bento 16 vai chegar à França com firulas do Direito Canônico nas mãos, que traduzem o perdão aos integristas excomungados. Trata-se, na prática, de uma insólita reaproximação do Vaticano com as dimensões ultraconservadoras da Igreja. Daí, o incômodo da consciência liberal francesa, espelhada nas reticências à visita que transparecem nas páginas de Le Monde. Para esse tipo de consciência, todos os fundamentalismos do momento, sejam quais forem as religiões ou as seitas, são iguais em suas predicações de racismo e sexismo, num novo tipo de conjugação financeira e moral que leva ao recrutamento de jovens nas regiões mais pobres do mundo para fins obscuros, às vezes inconfessáveis. É o dízimo que o atraso mental faz pagar à consciência moderna e termina financiando os "batmóveis" de todo tipo de "cavaleiro das trevas".

O fenômeno do que poderíamos chamar de "ultra-rigorismo integrista" extrapola, na verdade, o âmbito das crenças institucionalizadas e pode atingir até os comportamentos individuais de consumidores. Os desejáveis cuidados com a saúde, a alimentação, a ecologia etc. não estão isentos do perigo fundamentalista. É um fenômeno que retorna ciclicamente como aquilo que os neoplatônicos chamavam de eon, ou seja, uma forma transtemporal, recorrente. Vale a pena chamar a atenção de jornalistas e editores para as tentações dos exageros e abusos.

Fonte - Observatório da Imprensa

Nota DDP:
Sem entrar no mérito dos obliquos ataques à religião, a análise é interessante ao corroborar as realidade que se descortinam no horizonte profético, mesmo sem que o articulista delas tenha a menor idéia. O cerceamento das liberdades individuais, dentro em pouco, serão quase um clamor popular, já não são mais os "profetas do apocalipse" que vislumbram essa possibilidade.
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