Neste momento em que a gripe suína ameaça transformar-se na próxima pandemia, as maiores providências são determinar se a capacidade de transmissão da doença de um ser humano para outro se sustentará e, caso isso ocorra, o quão virulenta ela poderia se tornar. Mas mesmo se esse vírus regredir rapidamente, há uma forte possibilidade de que ele apenas passe a agir sem que seja detectado, continuando a infectar silenciosamente algumas pessoas enquanto se torna mais bem adaptado aos seres humanos, para, a seguir, explodir com força total em todo o mundo.
O que acontecerá a seguir depende basicamente do vírus. Mas depende de nós criarmos uma vacina o mais rapidamente possível.
Os vírus da gripe são imprevisíveis por serem capazes de sofrer mutações com grande velocidade. Essa capacidade lhes permite saltar facilmente de uma espécie para outra, infectando não só porcos e seres humanos, mas também cavalos, focas, gatos, cães, tigres e assim por diante. Um vírus aviário responsável pela pandemia de 1918 saltou primeiramente de pássaros para seres humanos, e depois de seres humanos para suínos (bem como para outros animais). Agora - e esta não é a primeira vez em que isto ocorre -, os porcos devolveram um vírus aos humanos.
A mutabilidade faz com que até mesmo os vírus bem conhecidos existentes sejam imprevisíveis. Um novo vírus, formado por uma combinação de vários outros, como é o caso deste microorganismo, é ainda menos previsível. Após saltar para um novo hospedeiro, a virulência da gripe pode crescer ou diminuir - de fato, variedades diferentes que têm uma origem comum podem seguir direções opostas - antes que surja um novo vírus relativamente estável.
Pandemias de gripe ocorrem desde o princípio da história, mas as quatro que conhecemos detalhadamente ocorreram em 1889, 1918, 1957 e 1968. A forma mais branda destas quatro, a chamada gripe de Hong Kong de 1968, matou 35 mil pessoas nos Estados Unidos e 700 mil em todo o mundo. A título de comparação, a gripe sazonal comum atualmente mata 36 mil indivíduos anualmente neste país, porque a população dos Estados Unidos é composta por uma proporção maior de pessoas idosas e outras cujos sistemas imunes são fracos (se um vírus como o da gripe de Hong Kong nos atingisse hoje, ele provavelmente mataria mais gente pelo mesmo motivo).
A pior pandemia de influenza, a de 1918, matou 675 mil pessoas nos Estados Unidos. E, embora ninguém possa precisar com certeza quantas pessoas morreram em todo o mundo, o número mínimo razoável é cerca 35 milhões, sendo que alguns cientistas acreditam que aquela pandemia matou até 100 milhões de pessoas - em uma época em que a população do planeta era apenas um quarto da população atual. Entre os mortos estavam não só idosos e bebês, mas também adultos jovens e robustos.
Ao avaliar a ameaça do surto atual, é importante não perder de vista que todas as quatro pandemias bem conhecidas parecem ter ocorrido em ondas. O vírus de 1918 surgiu em março e provocou, na primavera e no verão daquele ano, uma onda de contágio que atingiu certas comunidades e poupou outras. A primeira onda foi extremamente suave, mais até do que aquelas que caracterizam a gripe comum. Por exemplo, dentre os 10.313 marinheiros da Grande Frota Britânica que adoeceram, apenas quatro morreram. Mas o outono trouxe uma segunda onda, mais letal, que foi seguida por uma terceira onda menos severa no início de 1919.
Os especialistas especulam que a primeira onda de 1918 foi relativamente suave porque o vírus não havia se adaptado totalmente aos seres humanos. E, à medida que se adaptava, ele foi também se tornando mais letal. No entanto, há evidências fortes de que as pessoas que foram expostas durante a primeira onda desenvolveram imunidade - de forma similar a como as pessoas adquirem proteção com as vacinas modernas.
Um tipo de processo similar de criação de imunidade é a mais provável explicação para o fato de que, em 1918, somente 2% daqueles que contraíram a gripe morreram. Tendo sido expostos a outros vírus da gripe, muitos indivíduos desenvolveram alguma proteção. As pessoas que viviam em regiões isoladas, incluindo as reservas de índios norte-americanos e as aldeias de esquimós do Alasca, apresentaram índices de mortalidade bem mais elevados - supostamente por terem tido menos exposição a outros vírus da gripe.
A pandemia de 1889 também apresentou uma primeira onda bem definida que foi mais branda do que as ondas posteriores. As pandemias de 1957 e de 1968 também vieram em ondas, embora estas tenham sido bem menos definidas.
Em todos os quatro casos, o intervalo de tempo entre o momento em que o vírus foi identificado pela primeira vez e o crescimento da segunda e mais perigosa onda foi de cerca de seis meses. Serão necessários no mínimo quatro meses para a criação de uma vacina eficaz contra esta variedade de gripe, e muito mais tempo para a fabricação de uma quantidade de vacinas suficientes para a proteção da maior parte dos estadunidenses. A corrida começou.
Fonte - UOL
Nota DDP: Parece-me que este artigo, dos que até agora tomei contato, seja o mais amplo em termos de possibilidades. Por este motivo trouxe-o na íntegra. Vale a leitura para entendermos um pouco do que está acontecendo (mais especificamente que ninguém sabe ao certo o que está acontecendo), bem como do que poderá acontecer (mais especificamente que ninguém sabe ao certo o que irá acontecer).
Diante destas expectativas, tão errado quanto sentenciar que esta nova crise não carrega motivos de pânico, é o de que não carrega motivos de preocupação. O tempo dirá o que nos aguarda.