1. Destino comum dos bens da terra
É uma das constantes da doutrina social da Igreja, com origens na revelação bíblica e abundantemente afirmada pelos Padres da Igreja, desde os primeiros séculos do Cristianismo: a criação é dom de Deus a toda a humanidade e, portanto, os bens da terra não podem nunca, com justiça, ser apropriados por alguns, em prejuízo da grande maioria. Esta intuição precisou, no entanto, de fazer um caminho longo e tortuoso, no coração dos homens e nas estruturas das sociedades, antes de se tornar parte da consciência comum – caminho, aliás, ainda por concluir. Não é, de facto, evidente para a maior parte, mesmo entre os cristãos, esta exigência radical de solidariedade e justiça na distribuição dos bens da terra. As desigualdades sociais, muito para lá de quanto seria legítimo à luz das diferenças de capacidade e iniciativa entre as pessoas, permanecem uma realidade inquestionável. O mesmo se diga relativamente às relações entre países e povos e à miséria de tantos milhões ao lado da opulência de tantos outros.
2. Cuidar da criação
O cuidado pela criação – habitualmente designado ecologia – começa aqui: na justiça e solidariedade entre as pessoas. É aquilo que Bento XVI, na sua encíclica Caritas in veritate («A Caridade na Verdade»), chama uma sã «ecologia do humano», a qual inclui não apenas as relações entre as pessoas, mas mais ainda a relação da pessoa consigo mesma, com o seu corpo e a sua identidade. Sem esta «ecologia do humano», não há ecologia do ambiente com futuro – pois se o homem, centro da criação e seu cuidador, se degrada, a criação não poderá senão sofrer as consequências. Por isso, Bento XVI insiste na verdade – sobre o homem e sobre a criação, da qual o homem faz parte, mas com a qual não se confunde em absoluto – como pedra de toque das relações humanas e das relações dos humanos com a natureza. Só esta verdade vivida permitirá cuidar da criação, não a endeusando ou sacralizando, mas também não a violentando para lá daquilo que exige a humanização do mundo para o tornar mais habitável.
3. O cuidado da natureza e as «alterações climáticas»
Nos últimos decénios, as preocupações com o meio ambiente tornaram-se assunto, não apenas de discussão entre cientistas, mas dos meios de comunicação e do público em geral, sobretudo nos países economicamente mais desenvolvidos. No centro destas preocupações estão as «alterações climáticas» provocadas pelo «aquecimento global» do planeta. O papel da actividade humana no referido «aquecimento global» continua a ser objecto de discussão por parte de cientistas desalinhados do pensamento ecologista dominante – e mesmo o conceito de «aquecimento global» como fenómeno inevitável e sem recuo não é aceite por todos os especialistas. Apesar disso, é comummente dado por adquirido, pelo menos pelo ecologismo mais radical, que a acção humana é responsável por alterações climáticas, a prazo, catastróficas. Por influência deste ecologismo e do pânico instalado nas sociedades, hoje é comum medir-se o valor de cada ser humano pela chamada «pegada de carbono», ou seja, pela poluição que irá causar ao longo da vida. Percebe-se, deste modo, como a ausência da «ecologia do humano», urgida por Bento XVI, leva a uma radical inversão dos valores e a uma atitude destrutiva, face ao homem, em nome de uma natureza sacralizada.
4. Os cristãos e o cuidado da criação
No centro da missão evangelizadora da Igreja está o ser humano, única criatura querida por Deus por si mesma. Esta perspectiva antropológica permite-lhe propor uma relação com a natureza mais de acordo com a vontade do Criador, salvaguardando aquela, como habitação do homem, e humanizando-a, para que o mundo seja mais habitável – uma verdadeira ecologia. Viver esta atitude ecológica é dever de todos os cristãos, pois sabem que a natureza é criação amorosa de Deus, na qual o ser humano se integra como primeira de todas as criaturas e a única chamada à responsabilidade de cuidar de todas as outras.
Fonte - Ecclesia
Nota DDP: Ver também "Acordo detalhado em Copenhague será difícil" e "Mais uma conferência sobre clima, e acordo ambicioso ainda é miragem".